
Saiba o que está sendo feito no Brasil para acompanhar e combater a resistência antimicrobiana
Imagem: Canva
Reportagem de Mariana Perez, jornalista
E para monitorar a resistência antimicrobiana na medicina humana no Brasil, existe desde 2021, o projeto “Fortalecimento do Sistema Brasileiro de Vigilância à Resistência Antimicrobiana”, liderado pelo Laboratório de Bacteriologia Aplicada a Saúde Única e Resistência Antimicrobiana, do Instituto Oswaldo Cruz – Fiocruz, em parceria com o Ministério da Saúde (através da SVSA/DAEVS/CGLAB), Laboratório Central de Saúde Pública do Paraná (Lacen/PR), Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e Centros para Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos Estados Unidos.
O projeto tem como objetivo reforçar a detecção de bactérias e de fungos (cândida auris) super-resistentes, além de capacitar os profissionais envolvidos e permitir respostas mais assertivas e rápidas dos profissionais de saúde.
O Laboratório de Bacteriologia Aplicada a Saúde Única e Resistência Antimicrobiana da Fiocruz, que lidera o projeto, é referência no que diz respeito ao monitoramento a resistência bacteriana no Brasil.
Participam do projeto 25 hospitais, 27 laboratórios (Lacens - laboratórios centrais de saúde pública e há um em cada estado), sendo 10 deles laboratórios de referência regional.
A bióloga, pesquisadora, mestre e doutora em microbiologia, chefe desse laboratório que lidera o projeto, Ana Paula Assef (ver currículo completo na foto) conta que esses hospitais recebem insumos para avaliação de mecanismos de perfil de resistências de algumas bactérias específicas. “O objetivo é que possamos dar uma resposta rápida para esse perfil de resistência e, assim, otimizar o uso dos antibióticos. É possível saber, por exemplo, se a bactéria produz uma carbapenemase, que é uma enzima que hidrolisa os carbapenemas. Nesses casos, sabemos que não adianta usar determinados antibióticos e fazemos a troca de maneira mais assertiva”.
As amostras selecionadas são enviadas para um dos 10 Lacens, que farão a detecção molecular. O objetivo é padronizar esse trabalho em todos os 27 Lacens. “Todos esses laboratórios estão passando por controle de qualidade. Uma das metas é melhorar a qualidade do diagnóstico desde a ponta dos hospitais até os Lacens, e nos laboratórios de referência”, explica Ana.
Além do monitoramento feito por meio de várias metodologias, os envolvidos com o projeto também realizam a coleta de dados para o BR-Glass, sistema que integra uma plataforma de vigilância global (Global Antimicrobial Resistance Surveillance System - Glass). “São enviadas todas as bactérias que foram isoladas ao longo do ano. Dessa forma é possível ter uma noção de quais os principais microrganismos que causam infecção e qual o perfil de resistência desses microrganismos dentro do nosso país”, comenta Ana.
O Glass foi criado pela OMS, e é um sistema de monitoramento global. O Brasil desenvolveu o BR-Glass para enviar os dados para o Glass. O BR-Glass teve seu piloto lançado no Lacen Paraná e, com esse projeto financiado pelo CDC, foi ampliado para que tenha uma representatividade mais robusta do perfil de resistência dessas bactérias.
Outro ponto importante do projeto, de acordo com Ana, são os treinamentos realizados para capacitar pessoas descentralizadamente. “O grande ganho desse projeto é o fortalecimento como um todo do sistema de vigilância pelo país todo. Normalmente os principais profissionais capacitados estão centralizados no Sul e Sudeste e a ideia é que em outras regiões haja mais pessoas capacitadas e laboratórios fazendo técnicas mais aprimoradas. Dessa forma, ter a melhoria da vigilância em todo o território nacional”.
No segundo ano do projeto, teve início também as atividades de avaliação para controle e prevenção de doenças. “Além do monitoramento e vigilância, a Anvisa e alguns infectologistas trabalham conosco com foco em prevenção e controle em dois desses hospitais que fazem parte do projeto. Eles monitoram duas bactérias multirresistentes Klebsiella pneumoniae e Acinetobacter Baumannii e analisam como está o perfil de resistência no CTI desse hospital para que possa ser feita a intervenção. Com isso, a Anvisa fez várias ações para melhorar o controle como lavagem de mãos, entre outras, para ver o que diminui ou não”.
De acordo com Ana, no Brasil temos bactérias extremamente resistentes e há problemas de resistência em todos os níveis. “Há as bactérias que causam infecções na comunidade como infecção urinária, por exemplo. Mas aquelas que tem o pior cenário são as estão causando infecções hospitalares. Há uma diminuição da produção de novos antibióticos, há dificuldade de acessos em alguns países subdesenvolvidos. Isso tudo gera uma pressão gigantesca e as bactérias se tornam mais resistentes. A pandemia contribuiu para aumentar a resistência por conta do grande número de pessoas que foram internadas e, principalmente, contribuiu para mudanças nos tipos de mecanismos de resistência o que impacta no uso dos antibióticos. Há alguns antibióticos novos que só servem para alguns mecanismos de resistência e, se a bactéria conseguiu desenvolver outro mecanismo, esse antibiótico já não faz mais efeito” finaliza.
Confira as partes 1 e 2 dessa reportagem:
1 - Como a conduta dos veterinários contribui com a resistência das superbactérias? (Parte 1)
2 - Os sete erros mais comuns da terapia antimicrobiana na medicina veterinária (Parte 2)
Saiba o que está sendo feito no Brasil para acompanhar e combater a resistência antimicrobiana