A doença cardíaca é uma causa significativa de morbidade e mortalidade em gatos e cães.
Por Priscila Rizelo, coordenadora de Comunicação Científica – Royal Canin Brasil
Estima-se que 10% dos cães tenham algum tipo de doença cardíaca, sendo a doença mixomatosa da válvula mitral (DMVM) a de maior prevalência ao redor do mundo, representando 75% das doenças cardíacas em cães. A cardiomiopatia dilatada (CMD) é apontada como a segunda doença cardíaca mais comum em cães. Em gatos, as cardiomiopatias são frequentes e as doenças cardiovasculares estão entre as 10 causas mais comuns de morte na espécie. A prevalência exata das doenças cardíacas em felinos não é conhecida, mas estudos recentes mostram que a cardiomiopatia hipertrófica (CMH) atinge 15% da população.
O tratamento para doença cardíaca em cães e gatos varia de acordo com o tipo, causa subjacente e gravidade, no entanto, nenhum dos medicamentos disponíveis é curativo, o que significa que as mudanças estruturais no coração são irreversíveis. Além do tratamento medicamentoso, as intervenções nutricionais para doenças cardíacas constituem um dos pilares da terapia e tem papel importante no gerenciamento do equilíbrio vascular, combate aos radicais livres resultantes do processo oxidativo, gerenciamento da caquexia cardíaca, redução da inflamação, suporte à contratilidade e gerenciamento de eletrólitos.
A perda de massa muscular magra, também conhecida como caquexia cardíaca, afeta muitos cães com insuficiência cardíaca congestiva, especialmente aqueles com CMD e pode estar presente em gatos com cardiomiopatia em estágio D. A caquexia cardíaca é considerada um indicador prognóstico negativo para progressão da doença. Não há evidências de que a restrição proteica seja necessária para cães e gatos com insuficiência cardíaca congestiva e, provavelmente é deletéria, uma vez que esses pacientes estão predispostos à perda de massa magra. Intervir precocemente com uma dieta altamente palatável e com alto teor calórico pode ajudar a evitar a caquexia, já que ela é muito mais fácil de ser prevenida do que tratada.
Um dos nutrientes de fundamental importância no manejo da doença cardíaca é o sódio. Na doença cardíaca, há ativação do sistema renina-angiotensina-aldosterona e excreção anormal de sódio. O sódio dietético também pode afetar o acúmulo de líquidos (edema e efusão, como ascite) em cães com insuficiência cardíaca. A ingestão dietética de sódio baixa a moderada reduz a retenção de sódio e água, reduzindo assim a congestão. Em cães com insuficiência cardíaca crônica (secundária a DMVM ou CMD), foi demonstrado que a restrição dietética de sódio tem efeitos benéficos na redução dos parâmetros de tamanho cardíaco, em comparação com níveis moderados de sódio.
Em uma revisão de 1998 publicada por Freeman et al., é recomendado para cães e gatos com cardiopatia assintomática evitar a ingestão excessiva de sódio. Para esses pacientes (por exemplo, cães com DMVM Estágio B1), uma dieta para idosos pode ser adequada.
A declaração de consenso do American College of Veterinary Internal Medicine (ACVIM) recomenda começar com restrição leve a moderada de sódio em pacientes com DMVM nos estágios B2 e C, respectivamente, e restringir ainda mais a ingestão de sódio em pacientes com DMVM em estágio D com acúmulos de líquidos refratários. A razão para a restrição de sódio menos agressiva nos estágios iniciais da DMVM é que a restrição severa de sódio em cães com doença cardíaca crônica precoce pode levar a uma ativação excessiva e precoce do sistema renina-angiotensina-aldosterona e, com isso, acelerar a progressão da doença cardíaca. Em relação à restrição de sódio para os pacientes felinos com doença cardíaca, Nguyen et al. (2017) relatam que, embora a quantidade adequada de sódio dietético para gatos com doença cardíaca permaneça indeterminada, a pressão arterial não deve ser tão sensível ao sódio em gatos quanto em outras espécies. Fuentes et al. (2020) recomendam evitar dietas com altos teores de sódio para gatos com insuficiência cardíaca.
Além do sódio, o papel de outros nutrientes no manejo das doenças cardíacas dos gatos e cães já foi demonstrado. Estas evidências demonstram que pacientes com doenças cardíacas podem se beneficiar da terapia nutricional como coadjuvante no tratamento, sendo guiada pelos sinais clínicos do paciente e estágio da doença cardíaca.
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A doença cardíaca é uma causa significativa de morbidade e mortalidade em gatos e cães.